segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A primeira autópsia

A primeira vez que fui ver uma autópsia foi um dia verdadeiramente marcante na minha vida como pessoa, e um dos dias que marcarão o meu período académico (que lamechas).

O ano passado, durante o período que tivemos Anatomia, um dos professores da cadeira era médico legista no hospital cá do monte. Ora, como as pessoas cá do sítio, apesar de muito saudáveis também morrem, que isto não há cá excepções à lei da vida, autópsias são necessárias para dar o devido esclarecimento acerca da causa da morte do defunto à respectiva família.

Assim, e durante uma aula, está o professor na sua pose magistral, com os óculos bem na pontinha do nariz, quando recebe uma chamada a pedir a sua presença na morgue para uma autópsia a um senhor que, coitado, tinha caído morto no meio da rua no dia anterior. Eis que o senhor tem a brilhante ideia de nos perguntar se queremos ir e nós, armados em doutores num hospital tipo o de Anatomia de Grey, fomos a correr buscar as batas e voar para a morgue do hospital.

Lá nos equipamos devidamente, com máscara, luvas, bata, touca e uns outros adereços muito engraçados cor de burro quando foge, também conhecido como verde cirúrgico, igual àquele que vemos nos filmes. E que animação que foi, sentimo-nos mesmo como se estivéssemos a reviver uma daquelas séries famosas: ER, House, Anatomia de Grey, Scrubs...

O momento mais marcante foi, seguramente, quando entrou o cadáver na morgue. Não podendo revelar detalhes (que isto do sigilo é uma coisa muito à frente), aquela autópsia foi, como dizer, no mínimo chocante em todos os aspectos.

Meus amigos, uma autópsia é coisa que vocês não querem ver NUNCA na vossa vida. Garanto-vos, por experiência, que as coisas que se vêem, se sentem e, principalmente, se cheiram, são coisas que nunca se esquecem na vida. Falo a sério. Ainda hoje, se fechar os olhos, consigo recordar cada minuto daquele acontecimento, e consigo recordar, com muita clareza, todos os detalhes do corpo naquela mesa de metal.

Toda a autópsia foi, em termos de aprendizagem, fantástica. A sensação de se poder olhar para um corpo, um corpo a sério, a ser aberto pelas mãos mais conhecedoras da Anatomia Humana, é verdadeiramente formidável. Conhecer o nosso interior, ver que realmente somos feitos de vísceras todas lá embrulhadas e enfiadas, e também nós cheiramos mal, é soberbo, e é algo que, de facto, muda alguns dos nossos pensamentos.

O senhor, na casa dos 50, está um Domingo à noite a passear contente com a esposa, a caminho do café para ver o jogo do FCP, e algumas horas depois está na morgue, a ser esventrado e a fazer as delícias de 20 catraios curiosos que só querem ver as suas entranhas.

Desculpem o grafismo, mas realmente, é algo impressionante. Podemos ser tanto durante a nossa vida, e de um segundo para o outro, literalmente, não somos mais nada que um corpo inerte, sem vida, morto, acabado. Um monte de carne naquilo que, para mim, não é mais do que um talho humano. E é assim que os corpos são tratados lá.

Tive a ousadia de perguntar ao técnico de Anatomia Patológica se aquele trabalho não lhe fazia confusão, se não o impressionava. E ele respondeu-me que aprendeu a olhar para os corpos como se de um animal se tratassem, e aprendeu a desligar as emoções cada vez que entra naquela sala para descobrir o que matou mais uma pessoa. Porque, para ele, aquilo não são mais pessoas.

Pesado, hã?

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

2º ano

Como já devem ter percebido, o segundo ano chegou. Em força. Assustadoramente aterrador, pior que Belzebu em dia de azia.

Em meia dúzia de dias de aulas já estudei o suficiente para querer ir para a cama e não sair de lá nunca mais, enrolar-me nos cobertores em forma de concha e pedinchar mimo à minha mãe, como se estivesse doente e com 41º de febre.

Começamos o ano com Imunologia e Psicologia. São coisa giras, aliás, muito giras, e dava tudo para trocar o primeiro ano inteiro por duas semanas disto (Sistema Nervoso, ainda me estás aqui entalado), mas a quantidade de trabalho que isto dá é inversamente proporcional à minha paciência e vontade de manter a minha performance académica

A parte boa é que o tempo parece continuar a correr e que, neste fim-de-semana que passou, fui tratada como se fosse uma rainha: mimos suficientes para 1 ano, paparoca da boa preparada da minha mãe porque eu, coitadinha, fiquei logo com saudades da comida dela depois de três dias fora, todas as minhas necessidades atendidas como se eu fosse um qualquer sheik do Dubai como todas as mordomias à minha disposição. Disto é que eu gosto.

Sexta-feira, para variar, já tenho dois exames, porque vida-da-boa-durante-o-início-de-aulas é coisa que esta Universidade não conhece e se recusa a deixar-nos aproveitar, por isso, tomem lá dois exames para ficarem em casa a estudar enquanto lá fora está calor para ir à praia, os caloiros andam felizes e contentes a conhecer o estaminé e a ir a todas as festarolas e mais algumas, e tudo à vossa volta continua a gritar FÉRIAS, coisa que vocês sabem que efectivamente ACABOU.

A todos aqueles que já começaram as aulas mas ainda não têm práticas e as teóricas não são obrigatórias, congratulo-vos e invejo-vos feiamente. Àqueles que ainda estão de férias idem aspas. Aos meus colegas desta faculdade que sofrem tanto como eu, juntem-se à minha tristeza e pensem que o curso vai acabar depressa!

domingo, 8 de setembro de 2013

...

E o que mais custa não é voltar, é ver todos aqueles que não voltam comigo.

Não custa voltar à rotina de faz mala, desfaz mala, corre para aqui e para ali; custa sim ver todos aqueles que, finalmente, atingiram o seu sonho e nos deixam, assim sem aviso, sem notificação prévia, sem acção de despejo, sem 30 dias de avanço, para nos prepararmos que agora vamos enfrentar este ano sem aqueles que nos eram mais próximos.

A todos os que se vão e me deixam, sabendo que, mais um ano, não atingi o meu objectivo, fiquem sabendo que, sem os poucos de vós que me eram mesmo próximos, a coisa não vai ser a mesma! E que sejam felizes onde eu ainda não fui. Este ano perdi 30 de vocês.

E agora vou só até à Covilhã mais um ano...

sábado, 7 de setembro de 2013

Há coisas que doem...

Nota do último colocado este ano na FMUP: 18,1 valores;

Nota do última colocado este ano no ICBAS: 18,08 valores;

Nota que eu tinha quando fui colocada no monte: 18,2;

Ah f*da-se...

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Que m*rda é esta, karma???

Eu pedi, eu implorei, eu rezei e fiz uma macumba, mas ninguém me quis ouvir, ou então acham muito engraçado gozar com a minha cara e fazer-me sofrer SEMPRE na última semana de férias.

Ia eu hoje, descansadinha da vida, apanhar um comboio em Campanhã para passar um rico dia quando, não sei bem como nem porquê, as escadas rolantes resolveram atacar-me. Tropecei duas vezes e fiz uma sucessão de quatro cambalhotas à retaguarda seguidas, e só parei no fundo das escadas com um mar de gente à minha volta aos gritos e a chamar pelo INEM.

Resultado: parece que fui atacada por um urso, tenho as impressões digitais (leia-se riscas) das escadas tatuadas no corpo todo, acho que o ombro foi efectivamente deslocado desta vez, e o estado das minhas pernas é tão lastimável que me recuso nos próximos dias a ir para a praia.

OBRIGADINHA,  A SÉRIO, MUITO MUITO OBRIGADA.

Vou fazer o que me sugeriram no último post e declarar o estatuto de deficiente, física e especialmente mental. Dá regalias para entrar na faculdade! Assim pode ser que consiga sair do monte e viva os anos vindouros em paz.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Maleitas

Quando fui para a Universidade pela primeira vez, faz agora 4 anos, tinha sido submetida a duas cirurgias durante o Verão. Cheguei à faculdade e causei logo boa impressão: parecia uma grávida de 25 meses e a minha locomoção estava gravemente diminuída. Para além disso, andava de calças de fato-de-treino altamente inestéticas, o que foi fantástico para a minha reputação.

Quando mudei de curso e de faculdade, pensei "Desta vez não vou fazer figura de ursa e vou causar a melhor impressão possível". Uma semana antes de começarem as aulas parti um dedo do pé. Fui para o monte de muletas e com um dedo com uma tala, transpirando beleza por todo o lado, logicamente. Uma vez que era muito difícil subir e descer o monte com tais adereços, no segundo dia livrei-me das muletas, então andei um mês a mancar e a cambalear, o que, como é óbvio, me tornou a miúda mais fixe da faculdade. Todos queriam a companhia da croma manca com uma batata no pé. Ou não.

Hoje pensei que tinha deslocado um ombro na natação quando um senhor, em contramão e com um péssimo sentido de orientação, quase me arrancou um braço.

Senhores das maleitas, se é que existem, POR FAVOR deixem-me começar este ano lectivo em paz!

Muito agradecida.

The Final Countdown

Daqui a uns dias estou de volta àquela que, não sendo a minha segunda casa, o é, na verdade. Por isso, nestes últimos dias tenho tentado, de forma desesperada e sôfrega, agarrar-me a todos os segundos que posso aproveitar, como se a minha vida dependesse disso e nada mais fizesse sentido.

Estas férias passaram depressa. Depressa demais. Deixo tanto por fazer, tanto por ver, tantos filmes para ver e livros por ler. Deixo novamente os meus amigos sem cumprir todos os jantares prometidos, deixo a minha praia e o meu quarto, que nas últimas horas fica cada vez mais confortável.

À medida que o tempo passa só fica mais difícil sair mais um domingo à noite de casa e saber que só se volta na quinta ou sexta-feira a seguir. 

E depois começamos a pensar em todas as coisas que vamos perder nas próximas semanas: Amiga X faz anos dia 23 - não estou cá; Amigos vão fazer jantar de ano na primeira semana de aulas - não estou cá; Mãe vai à consulta de neurocirurgia - quero ir, mas não estou cá; Avó vai fazer uma cirurgia - não estou cá. Concerto no coliseu em Novembro - não estou cá. EU faço anos e não sei se estarei cá...

E estas coisas pesam. Não tanto pelo estar fora, mas por saber aquilo que estou a perder. E eu sei que devia mudar a atitude, pensar que é uma oportunidade, é o futuro, mas não dá.

Tento pensar que o tempo passa depressa, e passa, que o próximo fim-de-semana vai chegar rápido, que vai. Mas aí chegamos à conclusão que o tempo passa depressa demais, e que aquilo que queremos aproveitar rapidamente desaparece e dá lugar a mais responsabilidades e a mais uma semana de trabalho árduo.

Às vezes penso se vale a pena o esforço, se não teria sido melhor ter ficado em Medicina Dentária, na paz dos anjos. A ambição é lixada... Quero pensar que vale a pena.